quarta-feira, julho 28, 2010

Intimação infantil


Esta semana foi notícia uma menina de 6 anos. Nada de invulgar, até agora... Se é notícia, provavelmente terá feito algo de bom ou de mau... Pois, aí está... Ela não fez nada: esta menina foi intimada pelas Finanças para entregar a declaração de IRS do ano de 2008! Aparentemente, esta sobredotada menina, recebeu uma bolsa de estudos, não declarada, de uma universidade portuguesa...

Perante este acontecimento, correm rumores de que a ESA (Agência Espacial Europeia) suspendeu o seu programa de bolsas de estudo destinado a bebés de um ano... Estes pequenos alunos ficarão, já este ano, impedidos de prosseguir o doutoramento...

Com isto, é espectável que a qualidade do ensino português piore nos próximos meses...

terça-feira, julho 20, 2010

A Mecânica do Coração - Mathias Malzieu


Na contracapa pode-se ler "Um conto de fadas para adultos ao estilo de Tim Burton ou Lewis Carrol." Pois eu confirmo, não é publicidade enganosa!! Simplesmente devorei o livro em poucos dias, algo não muito comum...

Basta pegar no livro para se ter a sensação de que será uma excelente história... Esta segunda edição tem uma capa completamente adequada ao livro, ilustração de Benjamim Lacombe.

Jack nasce no dia mais frio do mundo, mais precisamente a 16 de Abril de 1874. Um dia tão frio que os pássaros cairam congelados do céu! Tão frio que pessoas morreram congeladas ou perderam membros que ficaram congelados! Mesmo assim Jack nasce na casa da doutora / feiticeira (dependendo das perspectivas) Madeleine. Madeleine realiza os partos de prostitutas e de encontros não permitidos. Jack pertence ao primeiro grupo... Assim que espreita os ares de Edimburgo, Madeleine constata que Jack tem um problema no seu frágil coração e, sem outra alternativa, coloca-lhe uma prótese: um relógio de cuco de madeira. Jack recupera e, tal como acontece com os outros filhos de prostitutas, fica com Madeleine, à espera de alguém que o adopte...

Jack, para manter a próteses na sua máxima funcionalidade, tem de obedecer a 3 regras: (1) não tocar nos ponteiros, (2) dominar a cólera, (3) não se apaixonar. São estas as regras que Jack é constantemente relembrado a seguir... Jack vive com Madeleine, uma vez que ninguém o adopta... A sua audível e visível prótese aniquila todos os possíveis pais. Um dia, na sua primeira saída à cidade, Jack ouve uma voz doce, sensual que aquece todo o seu ser! Jack conhece Acácia e os seus corações não aguentam... Existem as regras...

Acácia é obrigada a ir para a Andaluzia e devido aos problemas em que se meteu, Jack é obrigado a fugir de Edimburgo e decide procurá-la. Nesta viagem o pequeno Jack encontra-se com personagens como o Jack, o estripador e George Méliès.

Para saber o resto, terão de ler o livro. Numa escrita cativante, o autor usa (e abusa) das metáforas e comparações, numa elegante mistura de mundo infantil (os protagonistas são adolescentes durante a maior parte da história) com o mundo adulto. Imperdível!

Alguns excertos:

"
[...] Sinto-me agradavelmente normal com o meu relógio quando ouço um cliente a queixar-se da ferrugem da sua coluna vertebral.
-É metal, é normal!
-Sim, mas range quando mexo os braços!
-Já lhe receitei um guarda-chuva. Sei que é difícil encontrá-los na farmácia. Desta vez empresto-lhe o meu, mas tente arranjar um até à próxima consulta.
" pág. 17

"
[...] Há quem não pare de chorar para poder beber as lágrimas." pág. 22

"
O mistério que rodeia a pequena cantora excita-me. Faço uma colecção de imagens mentais das suas longas pestanas, das covinhas, do nariz perfeito e da ondulação dos lábios. Trato da sua recordação como de uma flor delicada, o que me alonga os dias.
Só penso numa coisa: encontrá-la de novo. Saborear, mais uma vez, o mais depressa possível, a mesma sensação inefável. Posso magoar-me, e depois? É uma questão de me consertarem mais vezes o coração. Desde que nasci não fazem outra coisa. estou em risco de vida? Talvez, mas também arrisco a vida se não voltar a vê-la e na minha idade isso ainda é mais grave.
" pág. 29

"
-Se tiveres medo de uma avaria, aumentas as hipóteses, justamente, de uma avaria." pág. 56

"
Amamo-nos como dois fósforos vivos. Não falamos, inflamamo-nos. Não nos beijamos, incendiamo-nos; o meu corpo transformou-se num tremor de terra de um metro e setenta de altura." pág. 81

Who is watching who?




sábado, julho 17, 2010

A Casa Quieta - Rodigo Guedes de Carvalho

Este é o primeiro livro que leio do Rodrigo Guedes de Carvalho. As expectativas eram, não vou negar, altas. Expectativas que não foram alcançadas com este livro... Tenho um outro, Mulher em Branco, para ler numa destas semanas...

"A Casa Quieta" retrata-se o amor, a traição, a perda, os sonhos, as pressões familiares para a natalidade, os rituais estabelecidos por nós, o distanciamento de entes queridos face ao donte mental... Isto tudo começando do fim, indo para o início e voltando para o fim, ou seja, partimos de 2005, depois somos levados para 1985 para depois retornar a 2005. A linguagem mais sofredora, mais liberta do pensamento das várias personagens no ano de 2005, torna a leitura difícil, por vezes confusa, onde se misturam o monólogo interno com o diálogo inventado ou desejado, numa fronteira por vezes ténue. Mesmo assim as várias histórias da história merecem uma leitura, embora não a ideal para depois de um longo dia de trabalho!

Alguns excertos:

"[...:] deixe-me falar-lhe de certas vezes em que tentei esconder nojo verdadeiro, em que senti que tinha tomado um caminho impenetrável, irresolúvel já, pelo número de anos que deixei andar [...:] perceber que me estava destinado defender quem não tem perdão possível, burlões assassinos assaltantes, ouvir a sua incongruente versão, escutar depoimentos a congeminar pontos de fuga, não a ouvir e indignar-me, não a ficar corado, insultá-los, passar à agressão
Sai-me já da frente
Quem te prende sou eu
mas a limitar-me a anuir, tirando apontamentos, revendo mentalmente artigos do código que me poderiam ser úteis, para assim serem úteis ao ladrão, ao violador
" pág. 108

"A coragem costuma esgotar-se-nos no essencial, e gerimos todo o silêncio que se segue na aturada engenharia de uma nova mentira, ou uma sucessão delas. Os militares chamam-lhe contenção de danos." pág. 119

"Os balanços são fáceis. Porque não adiantam nada. Chegamos a conclusões apenas para nos magoarmos. Ou para ter saudades. Quando na verdade não adianta. Gostamos de reflectir, de conjecturar. Achamos que isso faz de nós pessoas sensíveis, sensatas. Temos a mania das palavras. É o que distingue de facto dos animais. Somos bicho que adora conversar e que pensa que vai chegar a algum lado." pág. 165

"Apesar de não falar e parecer não ouvir. O meu marido havia de gostar que os filhos o visitassem. Está num sítio que dizem que é melhor para ele. Eu não compreendo que haja sítios melhores que a nossa casa. Mas também sei que nunca fui uma casa. Nunca fui a casa dele." pág. 175