terça-feira, julho 20, 2010

A Mecânica do Coração - Mathias Malzieu


Na contracapa pode-se ler "Um conto de fadas para adultos ao estilo de Tim Burton ou Lewis Carrol." Pois eu confirmo, não é publicidade enganosa!! Simplesmente devorei o livro em poucos dias, algo não muito comum...

Basta pegar no livro para se ter a sensação de que será uma excelente história... Esta segunda edição tem uma capa completamente adequada ao livro, ilustração de Benjamim Lacombe.

Jack nasce no dia mais frio do mundo, mais precisamente a 16 de Abril de 1874. Um dia tão frio que os pássaros cairam congelados do céu! Tão frio que pessoas morreram congeladas ou perderam membros que ficaram congelados! Mesmo assim Jack nasce na casa da doutora / feiticeira (dependendo das perspectivas) Madeleine. Madeleine realiza os partos de prostitutas e de encontros não permitidos. Jack pertence ao primeiro grupo... Assim que espreita os ares de Edimburgo, Madeleine constata que Jack tem um problema no seu frágil coração e, sem outra alternativa, coloca-lhe uma prótese: um relógio de cuco de madeira. Jack recupera e, tal como acontece com os outros filhos de prostitutas, fica com Madeleine, à espera de alguém que o adopte...

Jack, para manter a próteses na sua máxima funcionalidade, tem de obedecer a 3 regras: (1) não tocar nos ponteiros, (2) dominar a cólera, (3) não se apaixonar. São estas as regras que Jack é constantemente relembrado a seguir... Jack vive com Madeleine, uma vez que ninguém o adopta... A sua audível e visível prótese aniquila todos os possíveis pais. Um dia, na sua primeira saída à cidade, Jack ouve uma voz doce, sensual que aquece todo o seu ser! Jack conhece Acácia e os seus corações não aguentam... Existem as regras...

Acácia é obrigada a ir para a Andaluzia e devido aos problemas em que se meteu, Jack é obrigado a fugir de Edimburgo e decide procurá-la. Nesta viagem o pequeno Jack encontra-se com personagens como o Jack, o estripador e George Méliès.

Para saber o resto, terão de ler o livro. Numa escrita cativante, o autor usa (e abusa) das metáforas e comparações, numa elegante mistura de mundo infantil (os protagonistas são adolescentes durante a maior parte da história) com o mundo adulto. Imperdível!

Alguns excertos:

"
[...] Sinto-me agradavelmente normal com o meu relógio quando ouço um cliente a queixar-se da ferrugem da sua coluna vertebral.
-É metal, é normal!
-Sim, mas range quando mexo os braços!
-Já lhe receitei um guarda-chuva. Sei que é difícil encontrá-los na farmácia. Desta vez empresto-lhe o meu, mas tente arranjar um até à próxima consulta.
" pág. 17

"
[...] Há quem não pare de chorar para poder beber as lágrimas." pág. 22

"
O mistério que rodeia a pequena cantora excita-me. Faço uma colecção de imagens mentais das suas longas pestanas, das covinhas, do nariz perfeito e da ondulação dos lábios. Trato da sua recordação como de uma flor delicada, o que me alonga os dias.
Só penso numa coisa: encontrá-la de novo. Saborear, mais uma vez, o mais depressa possível, a mesma sensação inefável. Posso magoar-me, e depois? É uma questão de me consertarem mais vezes o coração. Desde que nasci não fazem outra coisa. estou em risco de vida? Talvez, mas também arrisco a vida se não voltar a vê-la e na minha idade isso ainda é mais grave.
" pág. 29

"
-Se tiveres medo de uma avaria, aumentas as hipóteses, justamente, de uma avaria." pág. 56

"
Amamo-nos como dois fósforos vivos. Não falamos, inflamamo-nos. Não nos beijamos, incendiamo-nos; o meu corpo transformou-se num tremor de terra de um metro e setenta de altura." pág. 81

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